07 setembro 2019

Buscai a claridade


Ao esvaecer das sombras
Esmorece o viço
Arrefece a dor
Ferve o frio
Cai a noite


*sugestão de leitura:(à sombra)

02 março 2019

Um brilho na chuva


A palidez das horas crava-se no dia molhado
Como quem se demora num gesto obtuso que arremeda o silêncio.
E o sol faz-se rogado, atordoado pelas nuvens
Carrancudas de chuva.

Há dias em que o sol só se abre em pequeníssimos raios
E falha uma luz maior a orientar o caminho.

Mas sabemos que o sol está lá
Todos os dias,
Por detrás do ar fechado,
Desdourado,
Sem se atrever a mostrar.

Como uma onda
No mar
Ou como as marés que influenciam a lua
Tudo tem um tempo.
E o tempo é para viver.

O tempo ajuda a moldar,
Desmoldar, refazer, levedar, dividir,
Repartir, adicionar e crescer,
Ainda que doa
A quem doer.

Mas haverá sempre uma outra qualquer onda por chegar.
Se não nos preparamos para o seu embate
Aprendendo a nadar ou tão-só a flutuar,
Ecoará a palidez
Roçagará o escarlate.

E também é preciso saber perder,
Para que não se prove o sabor amargo
Nem a árvore se despedace,
Pois não se pode contar só com vitórias.
Há que permanecer inteira, 
Nas cargas inglórias,
Com todos os ramos pegados ao tronco, à raiz.
Mesmo que nos viremos do avesso,
De cabeça ao fundo.

Depois, é levantar a cerviz
E retornar ao bulício do mundo.

Arriscar a semear um pouco de luz
E talvez colher algumas gotas de chuva luminosas.

Ainda que as nuvens se acerquem,
E em intempéries se alterquem,
Somando deslustro ao estrilho,
Não esmoreça o nosso brilho!

26 setembro 2018

Pousar


Toda a vida é feita de riscos,
rabiscos e outros iscos
e por vezes versos;
outras vezes silêncios apenas,
gritos mudos que entopem a voz
para lá dos poemas que assombram em voo.

E há palavras nascidas entre poeira e pedras,
sem a humidade requerida,
que depressa se transformam em pó que o vento leva.

Porque o mundo ao derredor é um vaso de barro fendido,
que não retém a água para a rega.

A lua vai e vem, enche e esvai-se;
com momentos luminosos
e momentos de penumbra;
mas volta sempre o seu brilho
embora às vezes por entre nuvens.

E há dias inteiramente noites que são tudo escuridão;
maré vaza, preocupação,
união ao mundo
que depõe o coração nas mãos
dormentes, doentes, cansadas, estropiadas,
dantes ensinadas,
que a custo reagem aos sonhos.

O tempo passa
e desgasta
como água de um rio correndo
corroendo tudo à sua passagem.

Rio que corre para o grande oceano,
com alturas de grandes caudais
e outras de seca extrema;
desfrutando da passagem por montes e vales,
pedras, pedregulhos, calhaus rolantes
e paisagens de planícies, praias
e campos verdejantes.

Assim, entre o voo e a noite escura 
tem de haver momentos de pousar. 
Aproveitar um fresco orvalho, 
visita do sonho que ainda emerge das mãos. 

E sempre recomeçar.
Adenda:

All life is made up of risks,
doodles and other baits
and sometimes verses;
other times only silences,
silent screams that clog the voice
beyond the poems that haunt in flight.

And there are words born between dust and stones,
without the required humidity,
that quickly turn into dust that the wind takes.

Because the world around is a cracked clay pot,
that does not retain water for irrigation.

The moon comes and goes, fulls and fades away;
with luminous moments
and moments of darkness;
but its brightness always comes back
though sometimes through clouds.

And there are days entirely nights that are all darkness;
ebb tide, worry,
union with the world
that deposits the heart in the hands
numb, sick, tired, crippled,
taught before,
that at cost, react to dreams.

Time goes by
and wears all out
like running river water
corroding everything in its path.

River that flows into the great ocean,
with high flow heights
and others of extreme drought;
enjoying the landscape through hills and valleys,
stones, boulders, rolling pebbles
and landscapes of plains, beaches
and green fields.

So, between the flight and the dark night
there must be times to land and forget the strain.
To enjoy a fresh dew,
visit of the dream that still emerges from the hands.

And always start again.

08 junho 2018

Poeira



Há poeira no ar. No chão da rua. Nas escadas de cimento velho que levam ao primeiro andar...  
Infiltra-se nas casas através das frinchas, e vai até ao mais recôndito da alma – um outro patamar.
Quando chove pode enfim remover-se a poeira que se tinha acumulado e tornado eira, esteira, ladeira íngreme e pestilenta, escorregadia. A chuva refresca, lava e depura a macilenta agrura em que se tornou o dia-a-dia de poeira-eira-esteira-ladeira. 
Mas há poeira a formar-se continuamente no mesmo lugar. 
E quando chove dias a fio, num tempo em que se esperava estio, a poeira-eira-esteira-ladeira engole-se à mesa da cozinha defumada, como se broa bolorenta fora manjar. 

Por vezes é preciso deixar a poeira assentar. E depois a chuva cair. E regar. Lavar. Escorrer. Até parar. 

Mas como tantas vezes isso tarda em acontecer!

01 janeiro 2018

Boa travessia!




Ainda que pedras nos apareçam atravessadas no caminho, 
aproveitemo-las para nelas firmarmos os pés, 
fazendo delas o alicerce de um caminho mais forte, 
rumo à Luz do horizonte.


07 agosto 2017

À compita


Pólen - atracção quase fatal.

– Chega-te para lá, quero pousar aí!

– Aqui não passas, eu estava cá primeiro!

 Arreda-te lá, que a flor dá para os dois.

– Chega-te mais, que isto não é tudo teu!

– Move-te, lesma!

– Não me empurres! Vai para outro lado...

... não te quero cá!
– Mas eu gosto deste pólen daqui.

– Olha que eu chateio-me! Queres apanhar?

– Ufa! Enfim só. Estava a ver que não me largava o pedaço!


17 abril 2017

Aleluia!



E eis que a vida inteira
Refloresce
O finito deu lugar à eternidade 
Perante o desconcerto do mundo


22 setembro 2016

Felicidade é...


Deixar florir

                                          Felicidade é

                                          Deixar florir

Muito mais que partir
É ir e sobrevir
Adicionar e repartir
Prosseguir
Seguir com um sonho
Agir


                                                                                                            Sentir a vida
                                                                                                                            E sorrir


Adenda em 24/08/2020:
tradução de Ana Freire na publicação Let it bloom...


"Happiness is
Let it bloom
Much more than leaving
It's to go and to arise
It's add and share
It's to proceed
To follow like a dream
It's to act
To feel the life
And smile."

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