26 abril 2012

Sem mão



Não era o lugar nem o momento ideais nem oportunos. Talvez por isso. E o proibido é o mais apetecido. Aula de História Social. Um letreiro (convite a loucuras inconfessáveis): multas para quem fosse apanhado com:
“ (…) 2.º – Mão naquilo (15$00); 3.º – Aquilo na mão (30$00); (…) ”
Sorriram-se, sentados na última fila.
Ele lembrou-se daquela anedota do filho do maquinista: “O quê?... primeira classe e os bancos são de pau?”. Realmente… não dava jeito nenhum… Ainda assim, o mundo parava ali.
Olhou-a, como quem não sabe o que quer… mas querendo. Olhou-o, como quem não sabe o que faz… mas fazendo. Olharam-se, como quem não sabe nada de nada, mas sabendo bem. O desejo começava a ser forte!… Um botão. Não!... Sim, dizem os olhos. Bolas!… aqui não!... Sim… Aquela mão irradiava centelhas de calor que o trespassava até à medula. Sentiu um arrepio profundo a inundá-lo. Céus! A carícia tinha ido longe demais. Não conseguindo aguentar começou por deslizar também, disfarçadamente, a sua mão pelo braço da sua amada… pela perna, até ao joelho… depois para cima, lentamente, saia adentro…
De olhos fechados, saboreou com sofreguidão a embriaguez que se apoderava dele.
— Humm… Oh!... ... ... Raios parta o sonho!...
Estendeu o braço e encontrou-a. Subiu-lhe a mão, quente, por debaixo da camisola e alcançou-lhe o mamilo…
Ainda bem que ela estava ali, mesmo à mão de semear…

10 abril 2012

A Pedinchice


Uma caixa de fósforos e meio litro de petróleo; um quilo de prego de meio solho e de ripa, misturados; um pacote de cloreto e um quarto de quilo de sabão azul; um pacote de massa de meada; meio quilo de açúcar amarelo. Com conta, peso e medida. Os rebuçados quase todos. Sem conta nem medida.
Foi assim uma tarde inteira atrás do balcão da loja. E um enorme ralho furioso do pai.
Aos poucos, o pai foi-lhe confiando a loja. Desde pequenina foi aprendendo e ajudando e, depois, quando o pai a sentiu preparada, para além de aviar os fregueses, passou a anotar as faltas de mercadoria e a fazer as encomendas aos vendedores quando o pai não estava; conferia, também, a mercadoria que os viajantes iam entregar e arrumava-a nas prateleiras; e, ainda, tinha ao seu encargo o registo das facturas das compras no livro.
Naquela tarde, o pai teve que sair e ela ficou sozinha a tarde toda, como noutras vezes. Até se desenrascou bem… só com os rebuçados é que correu mal.
– O frasco dos rebuçados está quase vazio porquê?
– Vendi-os…
– E onde é que está o dinheiro? – perguntou o pai, de gaveta aberta, depois de conferir as vendas que ela tinha anotado.
Foi apanhada. E teve que dizer toda a verdade, que era só uma: tinha-os dado à Nelita, à São e à Fernanda.
A voz do pai ecoou pela loja inteira e, decerto, pela rua além. Encolheu-se com medo de que a trovoada trouxesse chuva, mas a nuvem negra passou ao lado e escapou daquela. Não escaparia de uma próxima, deixou o pai prometido. Mas “não acontecerá mais”, também ela deixou prometido.
Daquela vez, as amigas conseguiram levá-la à certa quando lá foram chamá-la para jogar à macaca com elas. Como lhes disse que não podia sair, encostaram-se ao balcão a dizerem que, então, tinha que lhes dar rebuçados para as compensar; e voltaram mais vezes, com falinhas mansas, a pedir sempre mais.
Mas não voltaria a cair noutra, porque viu como foi palerma ao deixar-se levar na pedinchice delas e no que elas lhe diziam. Afinal, se elas gostassem dela, como ela gostava delas e, ainda mais, sendo duas mais velhas do que ela, não teriam ousado abusar da sua bondade e fraqueza, agindo daquela maneira, só pensando nelas e nada na amiga.

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