(Imagem de autor desconhecido)
Quando a ti Maria Amélia, de manhã, ia à taberna matar o bicho com o seu copito de aguardente, costumava, muito sorrateiramente, enquanto o taberneiro estava virado para outro lado, estender o braço e meter os dedos ao tabuleiro da marmelada e levar um bocado dela para a boca para fazer peito para a pinga. É claro que o taberneiro começou a desconfiar, por ver repetidamente a marca de uns dedos onde devia ser cortado à faca, e disse para com os seus botões que a havia de tramar. Então arranjou um tabuleiro igual, meteu-lhe dentro massa consistente e, naquele dia, sabendo que ela vinha sempre por volta da mesma hora, outro tabuleiro a esperava. Ela seguiu o ritual de sempre, pagou o copito e foi-se embora sem se desmanchar, mas de garganta bem untada. Pelo caminho, diz quem a viu e ouviu, que ia sempre “arrrtffff arrrtffff, aquele Manel tem lá agora uma marmelada que sabe mesmo à m.... arrtffff”.
Pobre da Maria Amélia, com o seu corpo vestido de farrapos, e sem ter eira, nem lareira onde se aquecer, nem sequer um palmo de seu onde cair morta! O seu homem fizera-se ao Brasil, ainda novo, na busca de uma vida melhor para o filho que lhe deixava na barriga, mas por lá ficara, decerto com outra família que arranjara. O filho crescera e, por sua vez, a deixara, depois de a esvaziar de tudo quanto tinha para cumprir os vícios que o haviam espreitado. Valia-lhe a compaixão de alguns vizinhos que lhe davam algum prato de sopa, ou umas pobres moedas, ou ainda um palheiro para pernoitar.
Errante, com o sol ou a chuva, ou os cães vadios por companheiros de jornada quando, sem tir-te nem guar-te, um carro a atirou de rompante para uma berma da estrada.
Atirou e fugiu, e ninguém viu. E a pobre ali ficou estirada, inerte, sem vivalma que a socorresse. “Está bêbada, que a descabece!”
Quando um bom homem se acercou, era tarde. “Acudam, a ti Maria Amélia morreu!”
(M.Fa.R. - 02.07.2010)
Pobre da Maria Amélia, com o seu corpo vestido de farrapos, e sem ter eira, nem lareira onde se aquecer, nem sequer um palmo de seu onde cair morta! O seu homem fizera-se ao Brasil, ainda novo, na busca de uma vida melhor para o filho que lhe deixava na barriga, mas por lá ficara, decerto com outra família que arranjara. O filho crescera e, por sua vez, a deixara, depois de a esvaziar de tudo quanto tinha para cumprir os vícios que o haviam espreitado. Valia-lhe a compaixão de alguns vizinhos que lhe davam algum prato de sopa, ou umas pobres moedas, ou ainda um palheiro para pernoitar.
Errante, com o sol ou a chuva, ou os cães vadios por companheiros de jornada quando, sem tir-te nem guar-te, um carro a atirou de rompante para uma berma da estrada.
Atirou e fugiu, e ninguém viu. E a pobre ali ficou estirada, inerte, sem vivalma que a socorresse. “Está bêbada, que a descabece!”
Quando um bom homem se acercou, era tarde. “Acudam, a ti Maria Amélia morreu!”
(M.Fa.R. - 02.07.2010)