17 junho 2025

Aos Santos Populares



Depois do Santo António e do São João
Que põem muita gente a bailar
Com o bom caldo verde, broa e a sardinha assada
E o suave cheirinho a manjerico no ar

Vem a fechar os festejos o São Pedro
Protector das viúvas e dos pescadores
Fazendo cair uma chuvinha quando quer 
Abre as Portas do Céu e acompanha as nossas dores
(Jo Ra Tone)

Respondendo à iniciativa de  Uma Quadra para um Santo
de Juvenal Nunes do blogue Palavras Aladas

07 junho 2025

Arte(s)


Tela René Bertholo 3

Não é um jogo. Nem de futebol, nem de qualquer outra modalidade desportiva. Mas há um jogador profissional de futebol e um professor de educação física metidos nesta história. Cheiro-os ao longe. É que entrar num museu não é entrar num estádio de futebol ou num ginásio; nem mergulhar numa piscina olímpica. É um mergulho, mas na arte, na história, no passado; é chamar o passado ao presente e levá-lo ao futuro. Posso assemelhar a entrada num museu à entrada numa biblioteca. Por isso, um escritor famoso, como eu, também procura raízes num museu. Já a um profissional do desporto será o desporto que o lá levará; ou a curiosidade ou, quem sabe, para acalmar alguma ansiedade.
Desta vez não podia ter sido em pior altura. Foi completamente danificado um quadro dos mais valiosos do museu. E não sei como aconteceu. Só ouvi um grande estardalhaço e, a seguir, vejo aqueles dois ali especados com cara de assustados, depois do enorme estrondo de vidro a partir.
E isto é uma coisa de que ninguém se pode rir. Como é que este aparato foi suceder? Aproximo-me a tempo de ouvir um deles dizer:
– Isto parece uma cena para os apanhados.
Ainda estou a tentar perceber, quando aparece o vigilante e nos aponta, aos três, como culpados. Digo que eu não, que nem sequer estava ali ao pé. Mas ao que ele responde:
– Se nenhum de vós assumir a culpa têm de ser os três identificados.
– Foi apenas e só o quadro que se soltou da parede. Caiu sozinho. – Encolhe-se o professor.
– Caiu sozinho? Coitadinho! Quem pensa que está a tentar enganar? Têm de vir todos à gerência do museu prestar declarações. – Responde o outro já mal-humorado.
Com aquele tom de voz não pode haver recusas nem excepções. E a destruição de um quadro valioso daqueles não permite contemplações.
Fiquei deveras preocupado: achei que ainda ia pagar pelo que não fiz. Mas antes de ser apurada qualquer responsabilidade, empertiga-se o jogador e diz:
– Eu pago o prejuízo.
Ora aí está alguém com pouco juízo. Mas com dinheiro, benza-nos Deus. Não há um culpado. Há um herói. O que também é arte. Não sei se é isso que me dói, ou se entender que ser famoso mas não ter dinheiro é ser do mundo dos fracos.
Mas não há que desanimar: agora é hora de também ter arte para apanhar os cacos.

(M. Fa. R. - 02.11.2010)

Texto também publicado em Escrita Criativa - Campeonato Nacional
.

06 junho 2025

Vento e Luz


(Imagem: Ma Dong Min)

Um vento meio silente sussurra
Nas pequenas horas da manhã
Quando a luz começa a arder
Por detrás das montanhas

Pelos umbrais rasteja
Em leve sopro
Nos dias em que a penumbra é chaga
E a luz é espada

Quem ousará abrir cortinas?
Quero ver o vento solto nos cabelos
E a luz uma dança nos olhares

20 dezembro 2024

É Natal




Paz e Amor
Saúde, Felicidade e Alegria
Deseja-se a todos nestes dias
Pois despontou a aurora na noite
Nas trevas brilhou uma Luz
Para nos apontar o caminho
Rompeu as sombras do mal
Da Virgem nasceu Jesus
Num presépio pobrezinho
Desceu para nós – é Natal! 

Respondendo ao 4º Encontro Temático de Juvenal Nunes - Um Poema de Natal

Publicado originalmente em 24/12/2010 em Nuvens de Orvalho (apagado), como resposta ao desafio de  Fábrica de Letras, Desafio de Dezembro
com Adenda em 31. 12. 2010
Sai um ano e entra outro
Para muitos de modo banal
Mas cresça um ano de luz
Que em todo o ano Natal!



11 outubro 2024

Grilaria

 

1 grilo!

2 grilos; 3 grilos; 4; 5; 6; ... 10? ou mais, montes deles a saltar, ao abrir a cancela do jardim, nunca tal vi antes assim. 

É na garagem; das paredes ao telhado do sótão, pela noite dentro em estridente sinfonia, pior: tal gri-gritaria!

Dormir? qual quê?!... quem pode dormir com o som agitado destes mestres em grilaria?

Fazer o quê com tanto grilar? Quem pode aguentar toda a noite até ser dia?

Enorme cantoria: até na igreja - sacristia - em pedra negra de cantaria.

Grilos no jardim;

grilos no quintal;

grilos na minha cabeça...

Sacanagem!

E até no aeroporto no regresso da viagem.


24 fevereiro 2024

Sem concerto


Os tempos são de descalabro, não há concerto nem conserto enquanto o crime compensar, enquanto a sociedade e cada um olharem só para o seu umbigo e não fizerem a distinção entre o bem e o mal. 
Para as pessoas comuns, que já levaram e continuam a levar com lavagem cerebral por parte dos media, já é tudo normal e só correm para onde lhes apontarem, quais ratos levados ao precipício e crianças enfeitiçadas à caverna pelo flautista de Hamelin.


09 julho 2023

Espera... é Verão!


Encostado a uma esquina do bar, come, mais do que lambe, o corneto de baunilha com a sofreguidão da tarde quente. Com a sofreguidão de um primeiro gelado, de um primeiro dia de calor, de um primeiro dia de praia, de um primeiro dia de Verão. Senta-se no muro pequeno, à sombra, com os pés assentes no relvado, e olha em redor. Sabia-lhe bem aquela frescura, fresca e leve, suave como a brisa mansa que o beija e lhe sorri nos olhos.
Espera. Espera como quem espera por algo ou alguém. Talvez apenas espere as horas passarem. Encosta o telemóvel ao ouvido.
Na outra esquina do bar, atrás dele, ela, vinda de dentro com uma chávena de café na mão, fala ao telemóvel.
Ele usa, no dedo anular da sua mão esquerda, uma aliança reluzente.
Ela guarda o telemóvel e volta para dentro.
Ele brinca com o telemóvel nas mãos e perde os olhos ao longe. Depois levanta-se e caminha. Recolhe-se ao interior da ambulância, estacionada junto às consultas externas, ao assento do condutor, e continua à espera. 

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