20 novembro 2024

Sem mão



Não era o lugar nem o momento ideais nem oportunos. Talvez por isso. E o proibido é o mais apetecido. Aula de História Social. Um letreiro (convite a loucuras inconfessáveis): multas para quem fosse apanhado com:
“ (…) 2.º – Mão naquilo (15$00); 3.º – Aquilo na mão (30$00); (…) ”
Sorriram-se, sentados na última fila.
Ele lembrou-se daquela anedota do filho do maquinista: “O quê?... primeira classe e os bancos são de pau?”. Realmente… não dava jeito nenhum… Ainda assim, o mundo parava ali.
Olhou-a, como quem não sabe o que quer… mas querendo. Olhou-o, como quem não sabe o que faz… mas fazendo. Olharam-se, como quem não sabe nada de nada, mas sabendo bem. O desejo começava a ser forte!… Um botão. Não!... Sim, dizem os olhos. Bolas!… aqui não!... Sim… Aquela mão irradiava centelhas de calor que o trespassava até à medula. Sentiu um arrepio profundo a inundá-lo. Céus! A carícia tinha ido longe demais. Não conseguindo aguentar começou por deslizar também, disfarçadamente, a sua mão pelo braço da sua amada… pela perna, até ao joelho… depois para cima, lentamente, saia adentro…
De olhos fechados, saboreou com sofreguidão a embriaguez que se apoderava dele.
— Humm… Oh!... ... ... Raios parta o sonho!...
Estendeu o braço e encontrou-a. Subiu-lhe a mão, quente, por debaixo da camisola e alcançou-lhe o mamilo…
Ainda bem que ela estava ali, mesmo à mão de semear…

19 novembro 2024

Grilaria

 

1 grilo!

2 grilos; 3 grilos; 4; 5; 6; ... 10? ou mais, montes deles a saltar, ao abrir a cancela do jardim, nunca tal vi antes assim. 

É na garagem; das paredes ao telhado do sótão, pela noite dentro em estridente sinfonia, pior: tal gri-gritaria!

Dormir? qual quê?!... quem pode dormir com o som agitado destes mestres em grilaria?

Fazer o quê com tanto grilar? Quem pode aguentar toda a noite até ser dia?

Enorme cantoria: até na igreja - sacristia - em pedra negra de cantaria.

Grilos no jardim;

grilos no quintal;

grilos na minha cabeça...

Sacanagem!

E até no aeroporto no regresso da viagem.


06 novembro 2024

A Potes


Um pote: metade barro do fundo à barriga; metade verde vidrado da barriga à boca. Pequeno. Em cima da mesa, no tampo de vidro. 
Outro pote: grande – do lado de fora do vitral. Escorre-lhe o amarelo vidrado sobre o branco barro. 

Para lá das arcadas, no cimo da montanha – lá ao longe – tomba a bruma ao encontro do verde das pastagens, por detrás do barro das telhas nos telhados – menos longe – parcialmente encobertos por outros verdes que se desdobram em vários tons de ramagens. Espessas. Compactas. Mais perto. Mas, por sua vez, outros barros de telhados se lhes sobrepõem – ainda mais perto – espreitando outros verdes, esguios de caniços e de folhas laminadas de palmeiras, oscilando na brisa – tão perto – no jardim verde de relva. Já ali. 

E debaixo da arcada, o pote. Escorrido de amarelo. E para cá do vitral, o pote. Metade verde vidrado da boca à barriga; metade barro da barriga ao fundo. Em cima da mesa, do tampo de vidro. 
Debaixo da mesa, outro pote. Invertido. Colado ao vidro. Reflexo baço de sombra. 
Por detrás da mesa, a cadeira. Aqui. E eu sentada nela. 
E espero. Sentada. 

A espera faz-se tão longe! A potes.


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