Pablo Picasso, Visage De La Paix (Serigraph)
(...) A alguém que corta as asas a uma pequena ave, que ensaia os primeiros voos, é-se desobrigado de dedicatórias.
Quero acreditar que não o terão feito por mal. O que me custa a aceitar é que sempre se vangloriassem desse facto, como se o tivessem feito com a melhor das intenções. Mas não são as boas e as más intenções que contam para as estatísticas, só os actos concretos. E há actos concretos que resultam de intenções inconscientes, saídas de atitudes assumidas, de religiões ou filosofias de vida. O corte das minhas asas foi uma mutilação genital. Um acto, não de pura maldade, mas de maldade pura. Uma maldade como se faz às galinhas, quando se lhes cortam as penas das asas, para que elas não voem por cima do muro, para as manter sempre no lugar a que pertencem – a capoeira; para que não se aventurem por outros lugares e se percam neles; para que não cruzem outros mundos e se afastem dos donos. Como pode voar uma ave de asas cortadas?!
No entanto eu voei. Unicamente por mérito próprio, voei. Colei as asas e voei (mesmo podendo talvez haver quem não tenha visto isso com bons olhos). Tarde, é certo, mas voei… voo. Apesar de todas as contrariedades: asas que tive de saber colar; ventos que tive de amainar; tempestades que teimaram em me amedrontar; calor escaldante que tive de arrefecer; frio cortante que tive de ignorar; florestas que tive de desbravar; desertos que tive de regar; uma infinidade de horas e dias e anos e sonos que tive de me roubar. Voei. Um voo incerto, inseguro, mas que tem adquirido cada vez mais consistência. Um voo que foi uma das coisas mais belas de que pude desfrutar.
Mais do que a meta que o voo pretenda alcançar, é o caminho percorrido, o céu explorado, o melhor da jornada.
A minha alma sente gratidão por me distinguirem no voo, por entre tantas outras aves que brilham ao sol; a mim, uma pequena ave de asas coladas.
Quero acreditar que não o terão feito por mal. O que me custa a aceitar é que sempre se vangloriassem desse facto, como se o tivessem feito com a melhor das intenções. Mas não são as boas e as más intenções que contam para as estatísticas, só os actos concretos. E há actos concretos que resultam de intenções inconscientes, saídas de atitudes assumidas, de religiões ou filosofias de vida. O corte das minhas asas foi uma mutilação genital. Um acto, não de pura maldade, mas de maldade pura. Uma maldade como se faz às galinhas, quando se lhes cortam as penas das asas, para que elas não voem por cima do muro, para as manter sempre no lugar a que pertencem – a capoeira; para que não se aventurem por outros lugares e se percam neles; para que não cruzem outros mundos e se afastem dos donos. Como pode voar uma ave de asas cortadas?!
No entanto eu voei. Unicamente por mérito próprio, voei. Colei as asas e voei (mesmo podendo talvez haver quem não tenha visto isso com bons olhos). Tarde, é certo, mas voei… voo. Apesar de todas as contrariedades: asas que tive de saber colar; ventos que tive de amainar; tempestades que teimaram em me amedrontar; calor escaldante que tive de arrefecer; frio cortante que tive de ignorar; florestas que tive de desbravar; desertos que tive de regar; uma infinidade de horas e dias e anos e sonos que tive de me roubar. Voei. Um voo incerto, inseguro, mas que tem adquirido cada vez mais consistência. Um voo que foi uma das coisas mais belas de que pude desfrutar.
Mais do que a meta que o voo pretenda alcançar, é o caminho percorrido, o céu explorado, o melhor da jornada.
A minha alma sente gratidão por me distinguirem no voo, por entre tantas outras aves que brilham ao sol; a mim, uma pequena ave de asas coladas.
(M. Fa. R. - 04.01.2010)
... colar as asas e voar pela poesia depois de alguém mal-intencionado as ter cortado, demonstra que és uma ave com uma enorme força de vontade e prazer pelo que fazes. Os voos assim são mais gratificantes.
ResponderEliminarBeijos.
*
ResponderEliminarninguém parará a força
das tuas asas coladas,
até Icaro, vencerás .
,
marés de vida,
deixo,
,
*
Ás vezes não precisamos dizer muito para dizermos a alguém o quanto lhes estamos gratos: Basta um olhar ou uma simples frase como esta que acabei de me lembrar agora: "Sem dedicatória, mas com dedicação" Bjs
ResponderEliminar"Tanto caminho andado desde o primeiro poema!... dizia Ary dos Santos. O que se faz para chegar onde queremos é fantástico, já que o mais importante é chegar. O resto, é resto...
ResponderEliminarBeijos, e parabéns pelo prémio.
Lindo texto o teu, lindo o teu voo.
ResponderEliminarBjs
Fá,
ResponderEliminarQuando a nossa convicção é grande não há quem consiga cortar-nos as asas em definitivo, porque elas acabam sempre por se regenerar.
Bjo.
Lindo teu texto, profundo, me arrepiei ao ler. Fa, você é uma pequena nota, mas preenche nossa alma com a mais bela música. Gosto de todos os seus blogues. Muito mesmo!!
ResponderEliminarPor mais que te queiram aprisionar, cortar tuas asas, jamais conseguirão, por tu és livre, teu espírito é livre. Alguém conseguiria segurar uma nota musical, um espírito? Não. Porque eles pairam no ar, voam nas asas do vento.
Grande beijo.
Se voas de asas coladas é porque a força te habita a alma: isso é o que mais conta!
ResponderEliminarO meu sincero abraço de parabéns!
Parabéns por teres escolhido uma excelente cola...rs.rs...
ResponderEliminarJá somos duas...
Mas, com a idade aprendi que nós é que deixámos que cortassem as nossas asas...por isso não culpo ninguém e sim a mim própria...que não tive a força e o empenho suficiente para voar...
Também acredito que era porque assim não estaria destinado...ELE sempre tomou conta das minhas decisões e atitudes...se assim deixou acontecer...era porque tinha de assim ser.
Um Santo dia para ti e sê feliz nos teus voos.
Bjs.
Mer
Amiga Fa
ResponderEliminarQuero dar-te os parabéns
E tambem pelas asas bem coladas.
Beijinhos e que a Foorça continue
Utilia
Incomensurável o desejo de voar
ResponderEliminarcom ou sem asas
Querida amiga,
ResponderEliminarseu texto me encheu de emoção. Escrevi sobre isso certa vez.
Quando foi podada minhas asas, amarram meus passos, prenderam minhas mãos,fecharam meus olhos e podaram meus sonhos...
Já fiz colagens em minhas asas, emendei meus pensamentos milhares de vezes. Tentei voar, mas asas coladas pesam muito. Então dificulta o voo.
Mas, o que importa, é colar, refazer, repetir e não desistir.
Apreciar o caminho enquanto se conserta os buracos e junta os cacos.
Beijos, que deus cuide sempre de ti.
Pode ser clichê mas o caminho faz-se caminhando. Há sempre gente pronta para cortar asas, as asas dos outros... nem consciência têm dos atos que praticam! Não sei como conseguem dormir... um dia a vida dá-lhe uma lição! Se dá!
ResponderEliminarAproveita as asas que por mérito próprio, conseguiste colar ( outro clichê) mais vale tarde do que nunca!
Beijinhos
Beleza, profundidade e muito tocante...Ninguém tem direito de podar as asas,mas muitas vezes a força de cada natureza as faz crescer... beijos, chica
ResponderEliminarMaravilha, Fá! Há pássaros com asas inteiras que não ousam alçar grandes voos. E outros que, com dificuldades, não encontram obstáculos intransponíveis na vida, pois já aprenderam a colar o que é quebrado pelos caminhos. Bjs.
ResponderEliminarLindo texto coroado pelo seu voo que nada impediu de fazer. Boa semana,
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